GOV. BR uma assinatura digital (juridicamente) insegura

Nos últimos meses, muitas pessoas passaram a utilizar a plataforma de assinaturas eletrônicas do GOV. BR como uma alternativa prática, gratuita e, por ser vinculada ao governo federal, presumivelmente válida para todo tipo de documento.

A proposta era sedutora: permitir assinar contratos, declarações e outros documentos e atos sem a necessidade do certificado digital no padrão ICP-Brasil, utilizando credenciais da conta GOV. BR com níveis de confiabilidade intermediário ou alto.

Mas a realidade jurídica é mais complexa.

A recente ampliação do uso da assinatura eletrônica pelo GOV. BR tem gerado dúvidas sobre sua validade jurídica em contextos privados ou em atos processuais, especialmente após decisões judiciais que a consideram inadequada ou insuficiente para determinados atos.

O Decreto nº 10.543/2020, que regulamenta o uso de assinaturas eletrônicas no âmbito da administração pública federal, restringe expressamente sua aplicação às interações com entes públicos federais. Ou seja, sua utilização para contratos entre particulares ou para procurações destinadas a processos judiciais não encontra respaldo normativo direto, exceto quando formalmente aceitas pelas partes ou reconhecidas por outros meios legais.

Na prática, isso significa que um contrato entre particulares assinado por meio da conta GOV. BR — mesmo com testemunhas — pode não ser considerado título executivo. E ainda que válido como contrato, sua força probatória ou executividade poderá ser contestada, dependendo da exigência de forma legal específica.

Esse entendimento teórico passou a ser respaldado, recentemente, por decisão unânime do Conselho Nacional de Justiça (CNJ).

𝗘𝗺 𝗺𝗮𝗿𝗰̧𝗼 𝗱𝗲 𝟮𝟬𝟮𝟱, 𝗼 𝗖𝗡𝗝 𝗳𝗶𝗿𝗺𝗼𝘂 𝗽𝗼𝘀𝗶𝗰̧𝗮̃𝗼 𝗻𝗼 𝘀𝗲𝗻𝘁𝗶𝗱𝗼 𝗱𝗲 𝗾𝘂𝗲 𝗮𝘀𝘀𝗶𝗻𝗮𝘁𝘂𝗿𝗮𝘀 𝗿𝗲𝗮𝗹𝗶𝘇𝗮𝗱𝗮𝘀 𝗲𝘅𝗰𝗹𝘂𝘀𝗶𝘃𝗮𝗺𝗲𝗻𝘁𝗲 𝗽𝗲𝗹𝗼 𝗚𝗢𝗩. 𝗕𝗥 𝘀𝗮̃𝗼 𝗶𝗻𝘃𝗮́𝗹𝗶𝗱𝗮𝘀 𝗽𝗮𝗿𝗮 𝗮𝘂𝘁𝗼𝗿𝗶𝘇𝗮𝗰̧𝗼̃𝗲𝘀 𝗱𝗲 𝘃𝗶𝗮𝗴𝗲𝗺 𝗱𝗲 𝗺𝗲𝗻𝗼𝗿𝗲𝘀 𝗱𝗲𝘀𝗮𝗰𝗼𝗺𝗽𝗮𝗻𝗵𝗮𝗱𝗼𝘀 (decisão anexa). A justificativa: a ausência dos requisitos de segurança, autenticidade e formalidade exigidos pela legislação específica, como o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) e o Provimento nº 103/2020 da Corregedoria Nacional de Justiça.

Antes de recomendar ou utilizar a assinatura GOV. BR em contratos, procurações ou documentos que possam gerar impacto legal relevante, é fundamental compreender e avaliar as suas limitações legais e tecnológicas. A digitalização é irreversível — mas nem toda assinatura digital atende aos requisitos legais de validade ou executividade.

A tecnologia deve servir ao Direito — e não o contrário. Assinatura eletrônica é meio, não fim. Ela precisa atender a forma legal conforme o ato jurídico aplicado.

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